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Começar com um rito mais desafiador impossível

Começar com um rito mais desafiador impossível

Imagens do primeiro trabalho do Barracão, como tudo começou.

Por Pai Alexandre Falasco

Uma viagem para muitas vidas. Um sonho, um ideal, que começou a se concretizar em 2004, precisamente em 9 de abril daquele ano em um trabalho muito especial, o Ritual de Fechamento de Corpo.
 
Estamos iniciando uma série de matérias em comemoração aos 10 anos do Barracão e esta sem dúvida é uma das mais importantes.
 
Foi neste dia que, com muito medo, não tenho vergonha de confessar, e ao mesmo tempo uma coragem que não era nossa, que tomou conta de nossos corações, “inauguramos” o Centro de Umbanda O BARRACÃO DE PAI JOSÉ DE ARUANDA.
 
É claro que essa história não começou exatamente neste dia, fomos muito bem preparados pela experiência de trabalhar em um terreiro fantástico, o templo Caboclo Flecha Ligeira. Eu, particularmente, busquei conhecimento e tive retorno nas minhas buscas sendo preparado no assentamento de Xangô e na passagem da Mão de Ifá pelo mestre Babalorixá Salvador Maria, assim como, da mesma forma a Mãe Silmara Falasco teve seu assentamento de Ogum celebrado por este ilustre filho do Orixá guerreiro. Contudo, foi preciso encarar muitos medos, muita insegurança, alguns dias antes deste 9 de abril, na tomada de decisão e no enfrentamento que esta decisão exigiu na ocasião, mas estávamos também sendo preparados por entidades muito sábias e a prova disso é que estamos hoje comemorando 10 anos  desta “loucura”.
 
Digo “loucura” porque parece mesmo loucura você querer assumir tamanha responsabilidade, contra tudo e contra todos, contra até mesmo as probabilidades, as estatísticas, mas a nosso favor estava nossa união, a nossa vontade e o aval de espíritos muito mais experientes do que nós e que, já havia um bom tempo, nos direcionava para esse fim, ou melhor, esse começo.
 
Providencialmente, esse trabalho trazia ao mesmo tempo a experiência dos queridos Pretos Velhos e em seguida a passagem forte e segura de nossos compadres e comadres, os Exus e Pomba Giras.
 
Éramos apenas nove pessoas, dentro de um congá ainda improvisado, e para nossa surpresa tivemos que improvisar cadeiras do lado de fora para uma pequena assistência que apareceu para nos apoiar, familiares e amigos, claro, pois nunca foi nossa pretensão nada além do que cumprir um ritual que já participávamos há anos no Terreiro do experiente Pai Salvador, mas dessa vez sem contar com aquela estrutura com mais de 25 anos de história.
 
Os pontos foram entoados, timidamente, pois a insegurança parecia ter aumentado com a presença da pequena plateia que não estava nos nossos planos, pessoas que chegaram trazendo algumas imagens de santos de presente para compor o pequeno congá feito por uma porta de madeira e adornado por esteiras de taboa, quase como um símbolo da simplicidade que o Barracão nunca perderia em sua essência.
 
Todos os ritos de abertura foram realizados, procuramos os ensinamentos e sabíamos, a Umbanda tem fundamento e é preciso preparar, defumação, cânticos, pembas e firmezas apesar das mãos tremulas, sinal de respeito pelo que estávamos prestes a realizar.
 
Todos se lembram, tenho certeza, que nossos semblantes preocupados só abriram um largo sorriso a partir das primeiras palavras do Preto Velho Pai José de Aruanda, que logo ao chegar brincou com todos, com uma segurança de tantas vidas, dizendo que estava muito feliz pela nossa abertura, mas que graças a Zambi aquilo iria melhorar muito, que ele gostava mesmo era da nossa alegria e isso iria acontecer daquele momento em diante, e assim foi, sorrimos, achamos graça do deboche do paizinho com a nossa angustia, na verdade todos se sentiram novamente amparados e lembramos que quando “baixa” o Guia, ele manda, ele faz, pois aprendemos que quem faz são eles, só precisamos ter o respeito para preparar.
 
O trabalho decorreu sob seu comando com maior tranquilidade daí então, foi perfeito.
 
Hoje, o Barracão recebe mais de cem pessoas por semana, isso quando não, esse número quase dobra, principalmente em datas especiais. Aprendemos antes e depois de sua fundação, e, sobretudo aprendemos nessa noite, que sem um Guia não somos nada e com um Guia somos muito, somos mais, podemos tudo que for de nosso merecimento e precisamos tratar cada gira, cada trabalho semanal com o mesmo respeito, com o mesmo cuidado, de preferência com as mesmas mãos trêmulas, sem deixar a rotina e os anos de experiência banalizarem o que é sagrado, sobrenatural, o que é muito maior do que a nossa mera existência falha e humana.
 
Fiquem com as fotos simples e históricas desse dia (ou melhor, noite, de sexta santa), e logo contarei aqui mais algumas histórias que fazem parte da identidade de nossa casa de axé.
 

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